Resenha: Travessia, por Ally Condie ♥



Contém spoilers porque, você sabe, é impossível de controlar. Pelo menos eu avisei!

"Nesse momento eu sei que não vou contar nada às outras meninas. Vou fazer o que sempre faço quando alguém confia a mim palavras perigosas: vou destruí-las." (p. 49)

A sequência de Destino. A tão esperada sequência de Destino. Bom, pelo menos para mim. Quando li Destino, pensei que esse tipo de livro, esse tipo de sociedade que a autora estava colocando sob o holofote era uma inovação. Claro que já tinha lido coisas do tipo e ouvido falar sobre coisas do gênero, mas com aquela ênfase e com aquele jeito tão metódico e controlado quanto o ambiente de Destino implantado pela Ally Condie. A maneira como a Sociedade e os Funcionários controlavam tudo, exatamente tudo. Com quem casar, o que comer, a maneira de se comportar, qual profissão seguir, até qual idade viver - absolutamente tudo; e o fato das pessoas simplesmente se conformarem com isso, tendo em suas cabeças que dessa maneira é melhor.

A diferença entre Destino e Travessia é grande. Começando pelo ambiente no qual se passa a estória. No final de Destino, os Oficiais levam Ky do Bairro por uma sequência de motivos, principalmente por causa da classificação que Cassia foi obrigada a fazer no posto de trabalho do Ky. A experiência que a Sociedade fez com os dois (a coisa de subliminarmente fazer com que os dois se amassem), também teve sua contribuição para o afastamento de Ky da Sociedade, pelo fato dele não ser mais útil à ela. Ky é uma Aberração, pois seu pai cometeu uma Infração indo contra os princípios da Sociedade (e isso nem é spoiler, minha gente). Já no começo de Travessia, somos apresentados à um novo ambiente, afastado das cidades criadas e controladas pela Sociedade. Ky é enviado à uma falsa aldeia para ser um falso aldeão - ou melhor dizendo, para ser uma isca. Isca para o Inimigo que ainda não apareceu e não ficou claro para mim quem diabos eles são. Tenho algumas teorias. Podem ser as outras Sociedades (ou outros países que não são a favor do método da Sociedade, mas que ela tem um controle tão grande sobre a população que consegue manter a existência de outras Sociedades em segredo), como também pode ser uma simples invenção da Sociedade (o que eu acho que talvez seja mais plausível) para controlar mais facilmente as pessoas, com essa falsa sensação de segurança. É por aí que a Cassia resolve sair do aconchego e segurança da Sociedade para ir em busca de Ky.

"Em algum lugar acima de nós o céu derrama chuva e penso em neve caindo. Pinturas feitas com água. Poesia sussurrada entre beijos. Coisas bonitas demais para durar." (p. 222)

O começo do livro é arrastado, fraco. Bate muito no dia-a-dia do Ky e da Cassia separados e tem um pouquinho de emoção quando Ky foge da aldeia falsa e Cassia chega à ela dois dias depois dele fugir. Enfim, é legal a autora explorar esse outro lado da Sociedade, mostrando que há um mundo além das Províncias abordadas no primeiro livro. Sabemos que há a Escultura e as Planícies Exteriores porque Ky as cita bastante em Destino, mas até aí, tudo pode ser mito. De todo o modo, uma coisa que me incomodou bastante nessa fuga dos dois foi a ausência dos Funcionários da Sociedade. No primeiro livro, a autora descreve a Sociedade como um sistema perfeito, sem falhas. Até mesmo suas falhas são planejadas, como o romance de Ky e Cassia que aparentemente era acidental, destino. Só que no final das contas descobrimos que não era, que foi tudo planejado. Mas esse não é meu ponto. Meu ponto é que enquanto Cassia e Ky fugiam, ninguém da Sociedade veio atrás deles. Quer dizer, ninguém percebeu que a Cassia, a menina perfeita da Sociedade, tinha fugido. Se a Sociedade é tão perfeita, por que não havia sentinelas na Escultura e nas falsas aldeias? São coisas sem explicação que incomodam o leitor, acostumado com a sistematização do primeiro livro. É claro que isso pode ser porque a autora quer mesmo que percebamos o quão a Sociedade pode não ser perfeita. Acredito que seja esse o real ponto. Mas ainda assim, as personagens deveriam fazer esse questionamento a si mesmas para que nós, leitores, pudéssemos acompanhar a linha de raciocínio também, já que estamos à mercê do ponto de vista de Ky e Cassia.

Apesar de ser mais monótono que Destino (não temos ação, acredite), Travessia não é todo ruim. Somos apresentados à Insurreição (mesmo que por meio capítulo, oi), a rebelião contra a Sociedade. Somos apresentados também à um novo grupo de pessoas que não estão à mercê da Sociedade, os agricultores, os quais não são contra e nem a favor do sistema aplicado nas cidades. Eles não tomam partido, no entanto, também têm de se esconder na Escultura ou em qualquer outro lugar. Tudo isso alternado entre o reencontro emocionante (foi fofo, tenho que admitir) entre Ky e Cassia e momentos fofos (e melosos, pelo amor de Odin) entre o casal. Ao que me parece, Travessia é um livro puramente introdutório (como deveria ter sido o primeiro), dando muita base e enredo para a continuação, Reached (Alcançado, em tradução livre).

"Mas o amor faz você olhar, olhar e olhar de novo. Você repara nas costas das mãos, no jeito de virar a cabeça, na maneira de andar. Quando você ama pela primeira vez, fica cega e vê apenas o glorioso e amado todo, ou a bela soma de todas as partes bonitas. Mas quando vê a pessoa amada como uma série de partes, de por quês - por que ele anda dessa forma?, por que ele fecha os olhos assim? -, pode amar essas partes também, e é um amor ao mesmo tempo mais complicado e mais completo. " (p. 255)

Minha esperança é que Reached seja o melhor livro da trilogia. Até agora, o primeiro, Destino, é que caiu nas minhas graças. Mas ao que me parece, Reached pode ser melhor. Com a descoberta do segredo de Xander (vamos lá, eu NÃO FAZIA IDEIA de que era isso) e a infiltração de Cassia na Sociedade como agente da Insurreição, faz com que as coisas possam ficar muito interessantes. Menos o trabalho de Ky, que não parece ser assim tão legal. De qualquer modo, Cassia terá que tomar a sua decisão entre Ky e Xander. Eu ainda tenho minhas dúvidas: ela só olhou para Ky por causa da experiência da Sociedade, vamos admitir. Xander era quem ela amava desde o começo. E então lhe mostraram uma segunda opção, algo proibido. E sabem o que dizem por aí, não é mesmo? Esse nem será o ponto alto do livro. Espero ver o que acontecerá com a Sociedade, se a Insurreição é mesmo tudo aquilo que diz ser e se o sistema será quebrado e como irão fazer isso. Com quem Cassia vai ficar é a última das questões (apesar de eu estar curiosa para saber, verdade).

É isso! Travessia não é um livro maravilhoso, mas é importante para a trilogia. Se você é fã dela, você precisa ler Travessia para ficar por dentro de tudo o que poderá acontecer em Reached. Alguns mistérios de Destino são revelados, outros aparecem, mas tudo na dose certa. É um livro um tanto massante em algumas partes pelos diálogos sem importância que se arrastam um capítulo inteiro. E o final nem é assim tudo aquilo. No entanto, Travessia é importante. É como se fosse uma série de dados que o leitor tem de ficar sabendo para compreender o final da estória. E, baseando-se nisso, Reached pode prometer toda a ação que os outros livros não teve.

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